FÁTIMA FELGUEIRAS. Tomem nota: Fátima Felgueiras, ilustre autarca da cidade com o mesmo nome, foi acusada de 23 crimes — cinco de participação económica em negócio, seis de corrupção passiva para acto ilícito, quatro de abuso de poder, três de prevaricação, dois de peculato, dois de peculato de uso sob a forma continuada, e um de peculato sob a forma continuada. Posteriormente, o Ministério Público entendeu retirar-lhe nove acusações, pedido prontamente atendido pelo tribunal. Refeitas as contas, Fátima Felgueiras vai a tribunal responder por 14 crimes. E o que vai o tribunal decidir sobre estas acusações? Se tudo correr conforme o habitual, vai decidir que Fátima Felgueiras não é culpada de nenhum dos crimes de que é acusada, e uma semana depois do veredicto exigirá uma indemnização ao Estado. Exagero? Veremos se exagero. Só mais uma coisa: lembram-se daquele sujeito que dizia que a perda de uma vida humana era uma tragédia, mas que a perda de um milhão de vidas humanas era estatística? Pois bem, salvo as devidas distâncias, o princípio mantém-se actualíssimo, e aplica-se inteiramente à Justiça que temos. É que a Justiça que temos demonstra que um cidadão acusado de um crime acaba na cadeia, e um cidadão acusado de dezenas de crimes acaba indemnizado pelo Estado. Sim, a lei diz que todos são inocentes até prova em contrário. Fátima Felgueiras é, portanto, inocente até prova em contrário. Aliás, ainda se há-de provar que nunca viajou para o Brasil, como as televisões largamente mostraram. Pior: ninguém se espantará caso isso suceda, que a Justiça portuguesa já não espanta ninguém. Estarei na primeira fila a fazer mea culpa caso o veredicto revele que me enganei. [Originalmente publicado em 24-9-2008]