E AS CRIANÇAS, SENHOR? Se é verdade que Paulo Pedroso nada teve a ver com aquilo de que foi acusado, a Justiça teve, de facto, um comportamento miserável, e jamais o ressarcirá dos danos (políticos, profissionais, pessoais) que lhe causou atribuindo-lhe uma indemnização de 100 mil ou de 100 milhões. Posto isto, importa, a propósito, perguntar: o que é feito das crianças da Casa Pia, hoje jovens ou adultos, que em tempos foram vítimas de pedofilia? Ninguém se indigna? Será que ainda correm o risco de acabar na prisão por terem denunciado quem delas abusou? Sim, porque houve arguidos que as ameaçaram com processos caso insistissem em os acusar, e certamente que a maioria não teve os meios para se defender que tiveram, por exemplo, alguns dos que ameaçaram lixá-los pela segunda vez. Pode ser que se tenham conformado, que tenham esquecido o episódio, e que nada mais lhes suceda. Pode ser que tenham metido na cabeça que há sujeitos perante os quais as leis se afastam para eles passarem, como diria Eça, e com quem é prudente não se meterem. Para bem deles, para bem de quem abusou deles, para bem de quem cuida deles, para bem das nossas delicadas consciências. Mas não pretendo com isto dizer mais do que disse, calma aí, e repito o que disse no início as vezes que for preciso. Acontece que me chateiam as indignações selectivas, e que o processo Casa Pia caminhe, rapidamente, para a impunidade total. Chateia-me o silêncio que se abateu sobre as vítimas e a indiferença generalizada, e que os comentários sobre o caso Pedroso não refiram, uma única vez, as vítimas, até ver os alunos da Casa Pia. Chateia-me, por último, saber que o assunto há muito estaria encerrado e os culpados na cadeia caso fossem outros os protagonistas. [Originalmente publicado em 5-9-2008]