EUROPEIAS. Uma sondagem do Correio da Manhã revelou que 70 por cento dos portugueses se está nas tintas para as eleições europeias. Isto é, 70 por cento dos portugueses não tenciona votar nas próximas eleições europeias, o que significa uma subida de nove por cento em relação a 1999. Como seria de esperar, a revelação desta sondagem deu lugar a um coro de preocupações. O Presidente da República veio logo dizer que ficou «aterrado». Vital Moreira não tem dúvidas de que é preciso «analisar as razões para esta verdadeira alienação dos cidadãos». E houve mais preocupações, muitíssimas mais, mas já não me lembro de quem e o que disseram. Ora, admitindo que são genuínas, o mínimo que se pode dizer é que já ouvimos estas preocupações um cento de vezes sem que nada tenha mudado. Bem pelo contrário. Mesmo depois de conhecida esta sondagem, os políticos continuam a fazer tudo para que aconteça exactamente o contrário. As presidenciais de 2006, onde os candidatos a candidatos tudo fazem para aparecer, são um bom exemplo. No espaço de uma semana, Cavaco Silva apresentou não sei que volume da sua Autobiografia Política e Santana Lopes foi recebido pelo Papa. Tudo isto numa altura em que as eleições europeias — precisamente as eleições em que os portugueses estão pouco interessados em votar — deviam dominar as atenções. Para ajudar à festa, o socialista José Sócrates lembrou que as eleições europeias serão «uma boa oportunidade» para fazer um juízo político sobre os dois anos de governo de Durão Barroso. Outro socialista, António José Seguro, disse que vai pedir «um cartão amarelo» ao Governo, e já avisou que pretende fazer das europeias um «trampolim» para outros voos. Francisco Assis, candidato socialista ao Parlamento Europeu, sonha candidatar-se a uma autarquia — e já avisou que, caso vença, abandonará o cargo em Bruxelas. Nos comunistas, a cabeça de lista às europeias não tem dúvidas de que as eleições de 13 de Junho devem ser encaradas como uma oportunidade para dizer não às políticas do executivo. Como se vê, as europeias não têm qualquer importância — excepto se forem um «cartão amarelo» ao governo ou um compasso de espera para outros voos. E, depois, ficam aterrados quando vêem sondagens como a do Correio da Manhã, como se não fosse evidente que comportamentos desses só poderiam acabar em resultados desses. Há outras razões que afastam os portugueses das eleições para o Parlamento Europeu? Sem dúvida que há. Mas, com razões como estas, nem são precisas mais. [Originalmente publicado em 21-4-2004]