FOGUETÓRIO. «Os portugueses não percebem que os clubes tenham milhões de euros para comprar jogadores e não tenham para pagar as dívidas ao Fisco», disse o ministro das Finanças. Vai daí, decidiu obrigar a Federação Portuguesa de Futebol e a Liga dos Clubes a cumprir o estabelecido há meia dúzia de anos, alegando que o acordo então alcançado (o famoso «totonegócio») estipula que os dois organismos paguem a diferença caso as receitas provenientes do Totobola não sejam suficientes para liquidar metade da dívida dos clubes até ao segundo semestre do ano transacto. Quer isto dizer que a Federação e a Liga poderão ter que pagar as dívidas em atraso acrescidas de juros, isto na melhor das hipóteses. Na pior, poderão ver penhorados alguns bens, nomeadamente os «passes» dos jogadores. Porém (há sempre um porém nos negócios da bola), o ministro foi dizendo que está disposto a dialogar, uma maneira de dizer que está pronto a ceder. Pior: Bagão Félix admitiu que se fosse presidente da Federação ou da Liga não pagaria um tostão. Do lado da Federação, o sr. Madaíl fez logo saber que a organização que dirige ficou «estupefacta pela falta de diálogo», e acusou o ministro de tomar uma medida «popular». O presidente da Federação alega que o Estado «nada fez para evitar o descalabro das receitas» do Totobola — que os responsáveis dizem ter perdido em abundância e que os clubes, segundo o tal contrato, vão ter que pagar. Pinto da Costa disse que as declarações do ministro são uma forma de desviar as atenções, que as verbas devidas pelos clubes são «uma gota no oceano», e que Bagão Félix é «ignorante». Isto há umas semanas. Agora, quando já se pensava que o assunto estava encerrado, o ministro veio lembrar que «os clubes não terão um tratamento favorável», e que o Ministério das Finanças não abdicará da cobrança da dívida — a bem, ou a mal. Demagogia pura e simples? Eu tenho Bagão Félix como um homem sério, sensato e competente. Mas como está de abalada, confesso que isto me cheira a foguetório, tanto mais que o presidente do Sporting acabou de dizer que os clubes «não devem nada» à administração fiscal. Assim sendo, está-se mesmo a ver que a questão vai sobrar para o sucessor — ou talvez para o sucessor do sucessor. Quando a questão se tornar inadiável, é só mudar de modo a ficar tudo na mesma. [Originalmente publicado em 22-1-2005]