CULPADOS E INOCENTES. Depois de tudo o que tem sido dito e do que tem ficado por dizer, continuo sem saber se a Justiça errou ao decretar a prisão preventiva de Paulo Pedroso ou se errou ao decretar a sua liberdade. Tenho dúvidas, também, que a Justiça está a funcionar (bem), como agora se diz a propósito de tudo e de nada, pois isso significa que dantes não funcionava (bem) e eu não sei se era assim. Antes de mais, há uma coisa que não consigo entender: porque haveria um juiz de decretar a prisão preventiva de um cidadão que lhe vai causar grandes dissabores — além de «um terramoto político» —, a não ser por razões muito fortes? Porque haveria um juiz de, na dúvida, optar por medida tão drástica (a prisão preventiva) quando dispõe de outras mais leves? Evidentemente que eu não acredito que o dr. Paulo Pedroso tenha sido preso — ou continue arguido — sem razões muito fortes. Também não creio na tese da cabala — ou maquinação, como agora se diz —, que os socialistas se fartaram de repetir. Não, não faço parte dos que desejam que os mais fortes devam ser condenados só por serem mais fortes, embora entenda quem assim pensa e seria bom que a Justiça mostrasse que também castiga os mais fortes. O que eu espero é o que espera qualquer cidadão: que sejam condenados os culpados, sejam eles fortes ou não. O que eu espero — e desejo — é que a Justiça trate Paulo Pedroso do mesmo modo como trataria qualquer outro cidadão. Não sei se o procurador-geral da República tem agido bem em todo o processo, mas concordo quando ele diz que «o Estado de direito só será uma realidade neste país quando um político for tratado perante a justiça como um simples cidadão». E também quando ele chama a atenção para aquilo que considera um atentado ao Estado de direito, pois «sempre que neste país um político está a contas com a justiça há uma tendência para politizar a justiça». É bom que se diga que não há qualquer indício de que a acusação a Paulo Pedroso tenha razões políticas. Políticas têm sido as pressões de que a Justiça tem sido alvo, nomeadamente por parte dos órgãos mais altos do Estado, que deveriam ser os primeiros a não o fazer. E como custa a crer que a Justiça seja surda e cega às pressões dos mais altos representantes do Estado — como, de resto, os últimos desenvolvimentos dão a entender —, é de temer o pior. Sem dúvida que mais vale um criminoso à solta do que um inocente na cadeia. Mas falhar no caso da pedofilia seria trágico para as vítimas e o descrédito total na Justiça. Além de que abriria caminho para que as vítimas se transformem em culpados, como já há quem ameace fazê-lo. [Originalmente publicado em 17-10-2003]