A ILUSÃO. Numa semana inteiramente dominada pelo regresso de Mourinho ao Futebol Clube do Porto, que mereceu honras de abertura dos telejornais durante dois ou três dias e directos televisivos a roçar o anedótico, apetece-me falar de um e-mail que recebi um dia destes. Dizia assim a missiva: «Somos uma empresa multinacional que tem 22 anos de mercado e está representada em 54 países. A empresa é líder mundial no seu sector e tem várias actividades para desenvolver a partir de casa ou de um escritório, podendo obter um excelente rendimento extra sem prejudicar o seu quotidiano.» Fui ver o sítio na «net» (www.trabalhe-em-casa.com) a pensar qual das minhas amigas teria fornecido o meu e-mail aos cavalheiros a pretexto, disseram eles, de que eu poderia interessar-me pelo negócio. O sítio contém mais de uma dúzia de histórias de sucesso («todas verdadeiras», evidentemente) mas não esclarece a natureza do negócio. Lá se fala vagamente de um «instrutor» que guiará os candidatos na «estrada do Sucesso» e que os ajudará a «desenvolver uma nova forma de pensar». O resto só numa entrevista, cujo formulário se encontra no sítio e as criaturas aconselham vivamente a preencher. E não se pense pedir informações suplementares por e-mail, porque eles têm mais que fazer do que responder a perguntas. Além disso, tirando a natureza da coisa, está lá tudo explicadinho em quilómetros de prosa. Não, não se trata de um daqueles esquemas para «enriquecer-depressa-sem-fazer-nada», como eles fazem questão de sublinhar. Muito menos um negócio destinado a «pessoas meramente curiosas», que eles não têm tempo para aturar curiosidades alheias. O negócio é sério e a prová-lo está o aviso de que é preciso ter muito cuidado com os «ladrões de sonhos», deixando a ideia que sabem bem do que estão a falar. Com certeza que, comparado com o negócio do senhor Pinto da Costa, esta estória de sucesso não passa de um fait divers sem qualquer importância e provavelmente nunca merecerá honras de abertura de um telejornal. Mas nem por isso deixa de ser outra forma de vender a mesma ilusão. [Originalmente publicado em 25-1-2002]