tag:blogger.com,1999:blog-89923388920090154092024-02-08T05:45:05.294-05:00DesabafosTextos inicialmente publicados na minha Página Pessoal.Unknownnoreply@blogger.comBlogger265125tag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-33924336830445577452014-04-08T13:35:00.005-04:002014-04-08T13:35:42.892-04:00<b>FALHANÇO TOTAL.</b> Como escrevi por ocasião das Presidenciais de 2008, votei Obama porque não me pareceu que o opositor fosse capaz de provocar a catarse que o país necessitava, porque me pareceu que Obama era o que melhor corporizava a vontade de mudança, porque achei que se renderia ao pragmatismo em matérias como a segurança, porque Obama era, em suma, o menos mau dos candidatos. Dois anos volvidos, o saldo é francamente pior do que imaginava. Obama falhou na economia (a fortuna injectada na banca e no sector automóvel não produziram os afeitos desejados), falhou no desemprego (que se mantém ao nível mais alto dos últimos 26 anos apesar dos milhões investidos em obras públicas com o objectivo de gerar emprego), falhou na saúde (se o seguro de saúde entrar em vigor será uma pálida imagem do que Obama pretendia e há sérias dúvidas de que irá beneficiar quem mais dele precisa), falhou na política interna (foi preciso a hecatombe das intercalares de Novembro para falar com a oposição), falhou na política externa (não só não acabou com a guerra do Afeganistão como ainda a alimentou e o Iraque não está inteiramente resolvido), falhou nos direitos humanos (proibiu a divulgação de fotografias de abusos sobre prisioneiros, pôs uma pedra sobre os voos da CIA alegando tratar-se de assunto de Estado, declarou que os detidos na base afegã de Bagram não tinham direitos constitucionais, Guantânamo continua por fechar). Até ver, apenas se pode gabar de diminuir o ódio à América, embora os americanos se ralem pouco com isso. Nem o Prémio Nobel da Paz, que lhe atribuíram sem que se percebesse porquê, esconde um desempenho medíocre, e a desilusão bem expressa nas intercalares de Novembro. Bem pode Obama atribuir o fracasso à herança da administração anterior que as evidências são muitas e só não as vê quem não quer, e é bom não esquecer que Obama sabia bem ao que ia quando se candidatou e nem por isso se inibiu de prometer o céu e a terra. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 16-11-2010]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-36050705618394644342014-04-08T13:34:00.002-04:002014-04-08T13:34:42.529-04:00<b>ESCREVEDORES & PUBLICANTES.</b> Provavelmente acharão um exagero se eu disser que resido e trabalho numa área onde há mais escritores que leitores, mesmo que pretenda fazer uma caricatura, por natureza um exagero. Partindo do pressuposto que um escritor também é um leitor (Vila-Matas escreveu que um escritor é um leitor que escreve), facilmente se conclui que haverá, pelo menos, tantos leitores como escritores, pelo que a caricatura pecaria, neste caso, por defeito. Infelizmente não exagero, nem pretendo fazer uma caricatura. Por incrível que pareça, conheço <i>escrevedores</i> que se gabam de nunca terem lido um livro, geralmente por falta de tempo (um clássico), de paciência, ou as duas coisas. Falo, portanto, de casos concretos, e partindo levianamente do princípio que um escritor é todo o indivíduo que publica, pelo menos, um livro de poesia ou de ficção, como por aqui se consideram os <i>publicantes</i> de um modo geral. Vi não sei onde um <i>cartoon</i> em que um leitor gatafunhava dedicatórias nos livros de uma fila de escritores, precisamente o inverso do que se vê no lançamento de livros. Se ali havia um exagero, aqui não há exagero. Mas não julguem que tenho um problema com os <i>publicantes</i>, que a circunstância de acharem o livro um objecto respeitável já não é mau. Lamento, apenas, que não passem daí, que não comecem a ler uns livritos, mesmo os que não se recomendam. Podia ser que um dia publicassem prosa legível ou poesia em que a bota não se limita a rimar com a perdigota, que a leitura naturalmente vai exigindo que se faça melhor. Ainda há pouco um argentino (Abelardo Castillo) dizia que «um escritor que não tenha lido não existe, não é escritor». Infelizmente, só é evidente para quem lê. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 22-10-2010]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-47363400988552455122014-04-08T13:32:00.002-04:002014-04-08T13:32:11.463-04:00<b>MONSTRUOSIDADES. </b>Tirando Carlos Silvino, que confessou ter cometido alguns crimes de que foi acusado, nenhum dos restantes arguidos no processo Casa Pia diz ter praticado os actos pelos quais foi condenado. De um modo geral, os arguidos reagiram indignados com o que consideram monstruosidades, e nem outra coisa seria de esperar depois de se saber que tencionam recorrer das sentenças. Mas se isto se compreende, se os arguidos não podiam dizer outra coisa quando pretendem apelar a outras instâncias, custa-me a crer que o tribunal que os julgou tenha cometido as monstruosidades de que o acusam. É preciso ver que a decisão foi tomada por três juízes (que consideraram credíveis os argumentos dos investigadores, de vários magistrados do Ministério Público e de mais dois juízes), e tudo leva a crer que os arguidos tiveram todas as condições para se defender. Não duvido que a justiça cometeu erros e que mereça, de um modo geral, todas as dúvidas, mas custa-me a crer que tenha cometido os erros grosseiros de que é acusada sabendo de antemão que todos os olhos estavam postos nela, e que não tinha, portanto, margem para errar. Lamentável é que a sentença acabe em coisa nenhuma — por causa dos recursos, por ultrapassar os prazos previstos, por outro motivo qualquer. Pior: as dúvidas que subsistem adensar-se-ão em vez de se dissiparem, o que é mau para a justiça e péssimo para quem está a contas com ela. Ficará, contudo, uma certeza: fossem outros os arguidos e estariam, há muito, na cadeia. Com culpa ou sem ela, mas isso é outra conversa. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 13-9-2010]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-32608657913083288162014-04-08T13:31:00.001-04:002014-04-08T13:31:04.468-04:00<b>PRAGAS.</b> É moda dizer-se que ninguém é isento, logo não é possível redigir uma notícia de forma equilibrada. Como já disse e repeti, concordo em casos excepcionais (manifestações desportivas em que intervém a selecção portuguesa, por exemplo), discordo em quase todos os outros. Não me parece difícil os jornalistas limitarem-se a noticiar os factos, deixando aos leitores (telespectadores, ouvintes) a tarefa de ajuizar pelas suas próprias cabeças o que houver a ajuizar. É essa, aliás, a função do jornalista, ou a primeira função do jornalista. Mas se for difícil, se não resistirem a meter o nariz onde não devem, se insistirem em omitir e/ou distorcer os factos de molde a convencer os leitores (telespectadores, ouvintes) a pensar de determinada maneira, então seria melhor que se dedicassem a outra actividade. O conflito israelo-palestiniano, sobre o qual todos parecem ter uma opinião definitiva apesar da evidente complexidade, é um bom exemplo desta prática, pois geralmente as notícias contêm opiniões que passam por factos, quando se esperaria que as notícias contenham os factos, e só os factos. Como é óbvio, factos são factos, opiniões são opiniões, e espera-se que não se misturem uns com os outros, muito menos deliberadamente. Infelizmente, nem os manuais de redacção e os livros de estilo nos livram desta praga. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 9-8-2010]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-40221736370289496562014-04-08T13:29:00.001-04:002014-04-08T13:29:25.548-04:00<b>FORA DE JOGO.</b> Não duvido que o Mundial de Futebol convém ao Governo em funções, e se as coisas correrem bem à selecção portuguesa ainda conviria mais. Mas é preciso ver que o povo anda «anestesiado» durante um mês não porque o Governo fez com que assim sucedesse, mas porque o povo (façamos de conta que é só do povo que se trata) quer que assim seja. Percebe-se que o cenário não convenha à oposição e não agrade a quem gostaria de ver o povo interessar-se por romances de Camilo e óperas de Wagner, mas o povo é mais dado ao futebol e à música do Quim Barreiros — e os «incomodados da bola» até costumam enaltecer a inteligência do dito sempre que há eleições e o povo vota de determinada maneira. Que mal tem o povo alienar-se durante umas semanas e esquecer-se da vidinha? Palavra de honra que não estou a ver. Pelo contrário, até me parece uma prática muito saudável. Ao contrário, destilar ressentimento contra o futebol e seus apoiantes é pouco inteligente e não ajuda a causa anti-futebol, além de demonstrar que alguns intelectuais têm um problema com o futebol sem que se perceba porquê. Dir-me-ão que o problema deles não é o futebol, mas o que consideram excesso de futebol. Acontece que o excesso de futebol é, para eles, tudo o que desvie a atenção do que julgam importante, pelo que qualquer dose é excessiva. Curiosamente, os países ditos civilizados, precisamente os países que eles não se cansam de apontar como exemplos a seguir, têm, sobre o futebol, mais ou menos o mesmo comportamento que os portugueses, e nem por isso deixam de ser civilizados. Como não deixam de ser civilizados os intelectuais que, em Portugal e fora dele, não vêem o futebol como coisa de selvagens, e também não me consta que o entusiasmo de alguns lhes abale a respeitabilidade. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 1-6-2010]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-18175823226328251042014-04-08T13:27:00.005-04:002014-04-08T13:27:59.077-04:00<b>UMA DERROTA ANUNCIADA.</b> Dizem que o fundamentalismo islâmico é uma minoria, e eu esforço-me por acreditar. Mas, sendo uma minoria, como consegue ela ter tanto poder? Convenhamos que não se espera de uma minoria que imponha valores a quem defende outros valores, modos de vida a quem escolheu outros modos de vida. Pegando no último caso conhecido, teriam os responsáveis de South Park censurado um episódio caso fossem ameaçados pela Igreja Católica em vez do Islão? Evidentemente que não teriam, e se calhar teriam aproveitado a ocasião para fazer uns episódios ainda mais «picantes», e o incidente acabaria com os responsáveis da Igreja Católica (reparem, os responsáveis da Igreja Católica, não uma minoria) a meter o rabo entre as pernas. Como é o Islão a fazer ameaças, como as ameaças do Islão são para levar a sério, os responsáveis de South Park puseram-se imediatamente de joelhos, e desculpem lá o meu jeito. Pior: o silêncio generalizado que o episódio mereceu demonstra que tais práticas já se tornaram rotina, o que equivale a dizer que estamos prontos a ceder o que for preciso, e a sacrificar o que for necessário. Sou agnóstico, mas a circunstância não me impede de ver que a Igreja Católica «encaixa» diariamente toda a espécie de críticas, algumas sem fundamento, e só para falar da Igreja Católica. A começar, aliás, pelo Papa, que não sendo o santo que alguns tentam fazer crer não se tem furtado a pedir desculpas pelos pecados próprios e alheios. Ao contrário, o fundamentalismo islâmico exige que lhe peçam desculpa pelo pecado de não pensarem como eles, e estamos cheios de sorte se acederem ao nosso pedido. É perturbante, é revoltante, mas é assim. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 31-5-2010]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-75607360311780051102014-04-08T13:26:00.005-04:002014-04-08T13:26:41.920-04:00<b>MAQUINAÇÕES.</b> É possível que exista uma «maquinação» contra a Igreja Católica usando a pedofilia como pretexto, como desconfia o cardeal Saraiva Martins, mas se vamos por aí também é provável que a Igreja Católica esteja a usar a teoria da «maquinação» como manobra de diversão. A pedofilia na Igreja Católica é infinitamente mais grave que a «maquinação», real ou imaginária, de que a Igreja Católica possa estar a ser vítima, como diariamente se constata. Esconder a realidade, além de obsceno, é contraproducente, e dizer-se que se pretende transformar «uma culpa pessoal em culpa colectiva» é pura demagogia. Pior: comparar os ataques à Igreja Católica como o pior do anti-semitismo, como fez um padre italiano num sermão proferido diante Bento XVI, é um insulto aos judeus, e até mesmo quem está pouco informado sobre o assunto sabe bem que as duas coisas não são comparáveis. Ainda mais: o autor da grosseria não é um padre qualquer, mas o autor de inúmeras obras de carácter teológico, e o «pregador pessoal» de Bento XVI. Com certeza que a pedofilia não é um exclusivo da Igreja Católica, e está por demonstrar que a a Igreja Católica alberga mais casos de pedofilia que outra agremiação do género. Seguramente que os pecados do Islão (ou cometidos em nome do Islão) não merecem um décimo do escrutínio que merecem os pecados da Igreja Católica, e só para falar num caso flagrante. Mas não é relativizando a pedofilia na Igreja Católica que ela se torna menos grave, não é escondendo os casos que vão surgindo que eles deixam de se ver, não é assobiando para o lado que o problema se resolve. Encarar a pedofilia na Igreja Católica como um problema «típico das famílias» que no recato das famílias deve ser resolvido, como também defende Saraiva Martins, é demasiado chocante para ser verdade. Mais sensatos foram os cardeais Policarpo e Torgal Ferreira, o primeiro ao dizer que «os pecados da Igreja (...) indignam o mundo e ofuscam a imagem do reino de Deus», e o segundo ao acusar a hierarquia da Igreja Católica de ocultar o problema para salvar a imagem. E se há coisa de que a Igreja Católica anda muito necessitada é de sensatez. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 6-4-2010]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-10137419384186361042014-04-08T13:25:00.004-04:002014-04-08T13:25:34.241-04:00<b>CHEGÁMOS À MADEIRA.</b> Quando ocorreu a tragédia no Haiti, as primeiras notícias falavam de mortos e feridos e de um país miserável, onde a tragédia teria sido atenuada caso não fosse governado por gerações de políticos que não se recomendam. Que me lembre, ninguém se indignou que assim se falasse. Agora, que a tragédia chegou à Madeira, quando alguém sugeriu erros de planeamento urbanístico, que eventualmente teriam reduzido a dimensão da tragédia, foi logo apelidado de canalha, e quem tinha algo a dizer sobre o assunto meteu o rabinho entre as pernas. Não sou especialista em planeamento urbanístico, mas a ignorância não me impede de ver o que me parece uma evidência: se é provável que os críticos de Jardim aproveitaram a ocasião para o criticar, não olhando a meios e a escrúpulos, também é nestas alturas que melhor se percebem os eventuais erros cometidos. As tragédias deviam, ao menos, servir para lhes conhecermos melhor a origem — de modo a evitar que se repitam caso seja possível evitar que se repitam, ou de forma a encontrar maneiras de minimizar as consequências. Concentrar as energias a enterrar os mortos e a cuidar dos vivos, como dizia o outro, é uma tarefa meritória, mas soa a pouco. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 15-3-2010]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-76310425945722275132014-04-08T13:24:00.003-04:002014-04-08T13:24:26.492-04:00<b>COISAS SIMPLES.</b> Cada vez tenho mais dificuldade em julgar as imagens que me chegam de cenários de guerra, terramotos e coisas afins. O que é razoável mostrar nas TVs? Imagens de grande violência são, por regra, exploração das vítimas, e grande parte das vezes não há dúvida que são. Fazer o quê, então, diante a violência extrema? Ficar por imagens «limpas» de modo a não perturbar os estômagos e não correr o risco de ser acusado de exploração da violência? Será que, assim, ficaremos com a noção exacta da dimensão das tragédias que nos mostram? Não estaremos demasiado habituados às «guerras limpas», onde nunca se vêem mortos e feridos agonizantes e cadáveres amontoados? Percebo as críticas às imagens que passam nas TVs, e não é preciso esforçar-me para concordar com elas. Mas o caso é mais complexo do que as críticas sugerem, e sem dúvida que é mais fácil apontar o dedo que a solução. O bom senso seria, aqui, a medida certa, mas o problema é que o bom senso é um conceito tão vago que cada um tem o seu. A realidade é a cores, como agora se diz por tudo e por nada. Simplificar o que não é simplificável, é demagogia ou ignorância. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 11-2-2010]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-37159804627800817922014-04-08T13:23:00.003-04:002014-04-08T13:23:17.272-04:00<b>INDEPENDÊNCIAS</b>. Antigamente, era pecado zurzir em quem estava no poder, e geralmente pagava-se cara a ousadia. Hoje, é pecado defender quem está no poder, embora os custos sejam infinitamente menores. Como terão notado, não sou, por princípio, contra o poder ou a favor do poder, seja o poder qual for, e será desnecessário dizer que um pouco de bom senso bastará para se concluir que nem tudo é mau no poder, e nem tudo é bom na oposição. Por mais que me chamem «seguidista» ou coisas piores, recuso-me a criticar o Governo se achar que não há motivos para tal, e parece-me desnecessário lembrar que quem é contra o Governo não é, necessariamente, independente, como tantas vezes se pretende fazer crer. Também não aceito que se ataque um governante (dirigente político, destacado militante de um partido político, casos do género) por este ter tomado uma medida que não agradou ou dito algo que não caiu bem usando como arma o ataque pessoal em vez de argumentos, para mim os únicos legítimos. Ser contra o poder é popular nos regimes democráticos, pelo menos nos regimes democráticos dignos desse nome, e sempre politicamente correcto. Mas como não pretendo ser popular nem politicamente correcto, digo o que penso, e logo se vê. Se vierem elogios, aprecio-os e agradeço. Se vierem impropérios, já estou vacinado. Ser independente tem custos. Geralmente apanha-se de todos os lados, incluindo dos independentes. Não é agradável, que não sou masoquista. Mas são as regras do jogo, e não estou disposto a trocá-lo por nenhum outro. Por mais que isso incomode algumas almas, por mais jeito que me dê, por mais confortável que seja. A não ser que me ponham um revólver à frente, que nesse caso mudarei de opinião sem grande dificuldade. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 15-1-2010]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-7868741939537771642014-04-08T13:22:00.000-04:002014-04-08T13:22:04.089-04:00<b>FADOS E GUITARRADAS.</b> Volta e meia criticam-me o escasso entusiasmo pelo fado, nos melhores casos alertando-me para uma deficiência, nos piores insultando-me. Dizem-me que o fado é isto e aquilo, que são precisos não sei que conhecimentos que eu não terei para o apreciar como deve ser apreciado, embora jamais me tenham explicado que conhecimentos são esses, e de que forma o fado deve ser apreciado. De tanto ter dado para este peditório, geralmente acolho as críticas com um encolher de ombros, e raramente me dou ao trabalho de argumentar. Mas há uma coisa que me tem esquecido de dizer, e que não perdeu pela demora: de um modo geral, os entusiastas do fado não apreciam música, ou só apreciam aquela música que geralmente se designa com adjectivos pitorescos que me dispenso de enunciar. Bem sei que há apreciadores de fado que gostam de música, e eu próprio conheço alguns casos. Mas falo da regra, e a regra parece-me esta. A não ser que os fundamentalistas me tenham calhado todos a mim (castigo divino, dirão alguns), mas acho pouco provável. Digo fundamentalistas porque é de fundamentalistas que se trata, pois genuflectem com uma facilidade espantosa sempre que falam de fado, e quando se fala de outras músicas são surdos que nem portas — ou só têm ouvidos para cantigas de que é melhor nem falar. Não é uma opinião, é um facto. Um facto que eu, como apreciador de música, sou o primeiro a lamentar, e não estou a ironizar. Um fundamentalista é basicamente um cego ou um surdo (ou as duas coisas), e cegos e surdos só me merecem respeito os que o são de facto. Cegueira por recusa de ver ou surdez por recusa de ouvir, causam-me pena nos melhores casos, e desprezo em todos os outros. Escusado será dizer que a nenhum deles reconheço autoridade para me dar lições de música, ou do que quer que seja. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 11-12-2009]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-38917066413783398432014-04-08T13:20:00.003-04:002014-04-08T13:20:39.204-04:00<b>REAL E VIRTUAL.</b> A ideia de que os <i>media</i> estão ao serviço dos governos, de só haver um ou outro jornal ou TV independentes que os governos tentam calar, é um argumento mais que estafado. Há jornais (e jornalistas) que fazem fretes ao Governo? Não duvido. Como também não duvido que há jornais (e jornalistas) que fazem fretes à Oposição, e só para não sair da política. Quem não ouviu que o Partido Republicano controlava os <i>media</i> no tempo de Bush, e Obama, apesar de ser do Partido Democrático, ganhou da forma que se viu? Quem não leu que a administração republicana se passeava com os <i>media</i> pela trela, apesar de os principais jornais americanos se terem posicionado ao lado do candidato que Bush acabaria por derrotar? Aliás, este último ponto levanta a questão de saber até onde vai o poder dos <i>media</i> em matéria eleitoral. Terão eles a importância que se lhes atribui? Devo dizer que não simpatizo com o actual Governo e com quem o chefia, mas já dei para este peditório. É que a realidade está sempre a desmentir as mais belas teorias, como a asfixia democrática, uma belíssima treta. Concordo que não há boa informação, que há erros em demasia e excesso de servilismo, mas nunca duvidei que existe pluralidade de informação. Será pouco, mas muito mais do que nos querem fazer crer. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 17-11-2009]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-37796000069760897962014-04-08T13:18:00.004-04:002014-04-08T13:18:29.869-04:00<b>BALELAS SARAMAGUIANAS.</b> Não sei se a <i>Bíblia</i> é um «manual de maus costumes e um catálogo do pior da natureza humana», como diz Saramago, e se <i>Caim</i> poderá «incomodar os judeus», como suspeita ou deseja. Duma coisa, porém, não duvido: Saramago é melhor na promoção dos seus livros que a escrevê-los, coisa, aliás, que não é difícil. Para não variar, a Igreja Católica voltou a cair na esparrela. Saramago «revela uma ingenuidade confrangedora quando faz incursões bíblicas» e «deveria informar-se antes de escrever», disse o bispo do Porto. Anselmo Borges acha que Saramago fez uma leitura «completamente unilateral» da <i>Bíblia</i>, o porta-voz da Conferência Episcopal disse que «um escritor da craveira de José Saramago deveria ir por um caminho mais sério», e o director da Faculdade de Teologia da Católica esperava que o escritor reconhecesse «o valor de obras que estão entre os grandes textos do património literário da humanidade». Também os judeus não resistiram. Saramago «não conhece a Bíblia nem a sua exegese», disse o rabino Eliezer di Martino. Dezoito anos após a polémica causada pel’<i>O Evangelho segundo Jesus Cristo</i>, eis mais um escândalo saramaguiano para animar as vendas, como sempre com a contribuição de uns quantos que melhor fariam estar calados. Por mim, se os primeiros parágrafos de <i>Caim</i> estiverem tão mal escritos como os primeiros parágrafos d’<i>O Evangelho</i> ou d’<i>A Viagem do Elefante</i>, o lançamento do livro não chega a ser notícia, muito menos motivo de controvérsia. Notícia seria se Saramago tivesse publicado um livro escrito de forma escorreita, mas isso seria pedir demasiado. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 21-10-2009]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-87073061484945874742014-04-08T13:16:00.000-04:002014-04-08T13:16:01.364-04:00<b>CRONISTAS.</b> Miguel Esteves Cardoso dizia, há pouco, que gosta de ler «coisas compridas que deram trabalho a descobrir», a «pensar», e a «escrever». Também eu tenho saudades dos tempos em que os jornais e as revistas publicavam textos compridos que deram trabalho a escrever, do tempo em que O Independente abria com duas páginas de Agustina, das revistas K e Best Off, e dos primórdios da Grande Reportagem. Mas o que realmente me chateia nos dias de hoje é ver alguns dos nossos melhores cronistas reduzidos a três parágrafos. Posso estar enganado, mas duvido que os leitores apreciem o modelo. Provavelmente os editores ter-se-ão convencido de que os leitores não têm tempo (ou paciência, ou as duas coisas) para ler mais que três parágrafos, mas eu duvido outra vez. Verdade que alguns me adormecem ao segundo parágrafo, e até já nem leio meia dúzia com esse receio. Mas destes não é o tamanho que me chateia. Chateiam-me porque escrevam coisas desinteressantes ou de forma desinteressante, às vezes as duas coisas. E não me refiro aos cronistas de que discordo quase sempre (podia citar alguns de que discordo quase sempre cujas prosas nunca dispenso), mas aos que escrevem de modo em que nem se aproveita o estilo, nem o conteúdo. É uma opinião, bem sei, tão discutível como qualquer outra. Mas o pior que me podem dizer é que tudo isto é relativo, e assunto encerrado. É que eu estou farto do relativismo que tudo iguala, quer seja bom, quer seja mau. Estou farto da preguiça mental que o relativismo, no fundo, encerra, para não dizer que o relativismo é uma forma de fugir à discussão. O que me convence são os argumentos, não os relativismos. E ainda me hão-de demonstrar que o formato minúsculo é o que os leitores preferem. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 1-10-2009]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-44752801354390445862014-04-08T13:14:00.001-04:002014-04-08T13:14:29.570-04:00<b>O FUTURO DO LIVRO.</b> Percebo o receio sobre o futuro do livro em papel, mas começo a cansar-me dos argumentos contra os meios electrónicos, alegadamente porque os meios electrónicos ameaçam a existência do livro em papel. Utilizo maquinetas de leitura electrónica há mais de uma década e nem por isso diminuiu o meu interesse pelo livro em papel, e não me parece que eu seja um caso único. Até ver, as maquinetas são mais um complemento que uma alternativa, embora às vezes sejam, de facto, uma alternativa, e uma alternativa por ser uma mais-valia. Ao contrário do que se tem dito, as maquinetas de leitura electrónica têm vantagens. Há livros que li no leitor de eBooks que dificilmente teria lido em papel. Umas vezes porque não encontro edições em papel, outras vezes porque as edições em papel são tão antigas que é preciso manuseá-las de modo a não se desconjuntarem, outras ainda porque é mais fácil encontrar edições na internet (de borla) que nas livrarias (a pagar). Li praticamente todo o Eça no leitor de eBooks, bem como quase tudo o que li de Camilo e Machado de Assis. Além destes, tenho a maquineta «carregada» com Euclides da Cunha, Padre António Vieira, Fernando Pessoa, Charles Dickens, Mark Twain, Charles Darwin, Joseph Conrad, Henry James e outros, quase todos tirados da internet. Não seria fácil desencantar edições em papel de alguns deles, nomeadamente dos lusófonos, muito menos residindo eu, como resido, nos EUA. Mas devo dizer que também eu prefiro o livro em papel (no leitor de eBooks perde-se o livro enquanto objecto, que naturalmente aprecio), que nunca deixei de comprar nem de ler, apesar de os livros em formato electrónico serem mais baratos e, por vezes, mais atraentes (pode-se mudar as fontes e o tamanho das letras, o que não é pouco). Um exemplo entre vários que podia dar: estou a ler a versão inglesa de <i>A Viagem do Beagle</i> no leitor de eBooks apesar de possuir uma edição recente em papel. Razão: o exemplar em papel é demasiado pesado (costumo ler deitado, pelo que o peso faz diferença), e o papel foi de tal modo aproveitado que sou obrigado a forçar a abertura do livro para além do que seria razoável. Como posso lê-lo no leitor de eBooks sem estes inconvenientes, ainda por cima de forma gratuita, por que não haveria de fazê-lo? Podia dar mais exemplos acerca das vantagens do leitor de eBooks sobre os congéneres em papel — vantagens, repito, que não põem em causa o futuro do livro em papel, nem o carinho que tenho por eles. Não que eu não admita que o fim do livro em papel não seja uma possibilidade, mas porque me parece que não será devido às maquinetas de leitura electrónica. Aliás, não deve ser por acaso que a indústria electrónica tenta, há anos, popularizar o leitor de eBooks, até ver sem sucesso. Mas se, um dia, substituírem os livros em papel, não será porque a indústria livreira assim o determinou, mas porque os leitores assim o quiseram. Tal como não foi a indústria musical que ditou o fim dos LPs e, não tarda, dos CDs, mas os consumidores, que perceberam as vantagens dos novos meios — e decidiram mudar. Se assim for, apenas se muda o suporte. O livro, esse, permanece, e isso é que importa. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 1-9-2009]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-84481928427952297292014-04-08T13:12:00.001-04:002014-04-08T13:12:16.826-04:00<b>PUTAS E SUBMISSAS</b>. Desconheço a seriedade do movimento «Nem Putas nem Submissas», mas simpatizo com o nome. Trata-se, ao que dizem, de um grupo de activistas muçulmanas que pretendem denunciar a «degradação da condição feminina» entre as comunidades imigrantes francesas, pelo que eu só posso aplaudir. Mas se isto não me oferece reservas, já me parece um disparate que deputados franceses (seis dezenas) e o próprio presidente Sarkozy defendam a proibição da <i>burqa</i>, a pretexto de que as <i>burqas</i> são «degradantes» e «verdadeiras prisões ambulantes», e que «a visão destas mulheres aprisionadas» é «inaceitável no solo da República». Discordo por uma razão elementar: por mais que se pretenda libertar a mulher muçulmana da opressão masculina, por mais que se queira pôr fim a situações repugnantes e inadmissíveis no mundo em que vivemos, por mais nobres que sejam as intenções destes e doutros beneméritos, a verdade é que nem todas as mulheres muçulmanas residentes em França usam a <i>burqa</i> porque a isso são obrigadas. É por esta e por outras como esta que nada se tem avançado contra as práticas fundamentalistas islâmicas, nomeadamente em países onde se espera que não aconteçam. Pelo contrário. Situações como esta apenas servem para andarmos para trás. Usando a lógica do fundamentalismo islâmico, proibindo em vez de deixar que cada um livremente decida o que fazer, acaba-se a justificar (e a promover) o fundamentalismo islâmico, precisamente o contrário do que se pretende. Espero, portanto, que os políticos franceses ganhem juízo, e que as simpáticas senhoras alcancem o que pretendem. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 5-8-2009]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-83242829726467094192014-04-08T13:09:00.005-04:002014-04-08T13:09:50.171-04:00<b>ELEITOS E NOMEADOS.</b> Contrariamente ao que ouvi a um deputado, já não me lembro quem e a que propósito, é bom recordar que os parlamentares portugueses não são eleitos. Verdade que alguns são (desempenham, de facto, o cargo para que foram eleitos), mas uma enorme quantidade não é. Três quartos dos deputados não estão na Assembleia da República porque foram eleitos, mas porque foram nomeados por quem neles manda (os partidos políticos), diz um estudo recente. De facto, o sistema eleitoral português não elege deputados: elege a percentagem de lugares no Parlamento a que cada partido que se apresenta a sufrágio tem direito. Como se perceberá, não é uma questão de palavreado ou de interpretação dos resultados eleitorais, que cada um faz como lhe convém. É uma questão de facto, e os factos não se discutem. Também não é, evidentemente, a descoberta da pólvora. Mas é bom que tenhamos presente que as coisas são o que são, e que saibamos em quem votamos quando votamos nas legislativas, por mais interessantes que sejam os candidatos que nos ponham à frente e nos garantam que serão eles, uma vez eleitos, que nos irão representar. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 6-7-2009]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-37801344152784960272014-02-18T14:07:00.001-05:002014-02-18T14:07:15.381-05:00<b>PRAGMATISMO E VARIAÇÕES.</b> Contrariamente ao que possa parecer, sobretudo aos que me lêem no blogue, desejo que as coisas corram bem a Obama. Antes de mais, porque Obama dirige o país que escolhi para viver, e onde tenciono permanecer nos próximos anos. Depois, votei nele por me parecer que Obama era o menos mau dos candidatos, e por acreditar que a simples ideia de que as coisas iriam mudar, como ele prometeu, era, por si só, positivo. Pareceu-me, finalmente, que Obama se renderia ao pragmatismo em matérias como a segurança e o terrorismo caso fosse eleito, e o que está a acontecer demonstra que não me enganei — ou que não me enganei inteiramente. Posto isto, devo dizer que vejo com apreensão as hesitações que Obama tem vindo a demonstrar em matérias como as que acabo de enunciar, que já o levou a fazer um discurso ao país procurando tranquilizar os mais cépticos. Qualquer pessoa que não morra de amores pela política em geral e pelos políticos em particular sabe bem que a questão da segurança e do terrorismo é mais delicada do que muitos pretendem, e toda a gente também já percebeu que as medidas tomadas por George W. Bush teriam que ser tomadas na altura em que foram tomadas, como também começa a ser evidente que as medidas seriam tomadas na mesma caso o presidente fosse outro, republicano ou democrata. Eu sei que estou a chover no molhado, e até já ouço dizer: «Lá está o gajo a defender Bush, esse malvado.» Acontece que eu não mudo conforme os ventos e me chateia que a importância dos factos varie consoante os protagonistas, e não aceito que hoje se aplauda pelas mesmíssimas razões o que ainda ontem se condenou. Chateia-me, por último, a mentira e a má-fé, a ponto de me fazer sair em defesa de um inimigo caso esteja a ser vítima delas. Um exagero, bem sei, mas é assim. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 11-6-2009]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-74397317800480131812014-02-18T14:05:00.006-05:002014-02-18T14:05:55.172-05:00<b>SAL A MAIS.</b> Alertado por Alberto Gonçalves, cujas prosas na Sábado e no DN integram a dose semanal de leituras que nunca dispenso, fui ler o texto que o deputado Jorge Almeida publicou num jornal da minha terra onde defendeu a famosa lei que prevê a redução do sal no pão. Diz o deputado que não se deve pactuar com «perfis comportamentais de risco para a saúde», pois é a comunidade que paga «a factura da doença, da «invalidez», ou «da morte prematura». «Quando estão em causa problemas de saúde pública de grande relevância» resultantes de «causas modificáveis», prossegue o deputado, «faz todo o sentido introduzir alguma regulação». Ora, seguindo o raciocínio do ilustre, por que não reduzir o açúcar, as calorias, as gorduras, os fritos e tudo o resto que ponha em risco a saúde? Por que não, já agora, reduzir os deputados que nos querem salvar, provavelmente casos de saúde mental? Quando é que os políticos metem nas cabecinhas que não é função do Estado decidir o que devemos comer e quantas quecas (e com quem) podemos dar? (Sim, exagero, mas lá chegaremos.) Os políticos estão preocupados com a nossa saúde? Então obriguem as panificadoras (e demais indústrias alimentares) a expor os seus produtos no mercado acompanhados de informação acerca do teor de sal e doutras coisas que fazem mal, deixando ao consumidor a liberdade (sim, é de liberdade que estamos a falar) de escolher o que lhe interessa e de excluir o que não lhe convém. Não queiram decidir por nós o que só a nós compete decidir, e exercer funções para as quais ninguém os elegeu. E, já agora, façam o favor de não nos tratarem como se fôssemos crianças ou atrasados mentais. O facto de os termos eleito pode prestar-se a essas leituras, mas não é caso para tanto. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 14-5-2009]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-85507885172059582632014-02-18T14:04:00.006-05:002014-02-18T14:04:49.411-05:00<b>O ENGODO.</b> Se bem me lembro, construíram-se estádios de futebol porque os estádios de futebol eram necessários para o Euro2004. Agora, pondera-se fazer o Mundial porque o Mundial seria, segundo alguns, uma forma de rentabilizar as infra-estruturas já existentes, a grande maioria construídas (ou remodeladas) por causa do Euro2004. Como se adivinha, os que agora argumentam com a rentabilidade dos estádios são os mesmos que ontem não se ralaram com isso, apesar de gente avisada os ter alertado, na altura, para a evidência. Como a generalidade dos portugueses, estou para saber se Portugal ganhou alguma coisa com o Euro2004. Sei, como todos sabem, que se gastaram milhões para construir (ou remodelar) estádios hoje às moscas e que, agora, dizem ser preciso rentabilizar, embora ninguém acredite que não vão ser necessárias mais umas obras — e correspondentes milhões. Como já perceberam, não acredito num Mundial de borla, muito menos no engodo da rentabilização dos estádios. Como ficou demonstrado com os estádios do Euro2004, que custaram não sei quantas vezes mais que o inicialmente estimado, o que ora nos parece barato há-de sair-nos caro. Esperemos para ver o que a candidatura vai dar, mas seria bom que não perdêssemos a realidade de vista. Não a realidade que nos querem meter pelos olhos dentro, mas a realidade que, apesar dos malabarismos, não deixa de ser o que é. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 21-4-2009]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-88102722938878472682014-02-18T14:03:00.004-05:002014-02-18T14:03:51.186-05:00<b>PORNOGRAFIA II.</b> É um facto que só uma minoria se interessa por arte, provavelmente uma minoria muito reduzida. Só essa minoria estará, portanto, em condições de distinguir um Picasso de um habilidoso, um Schönberg de um chico-esperto, ou um Eça de uma «besta célere»<span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">(*)</span>. Não é assim? O recente episódio de Braga (a PSP local apreendeu meia dúzia de exemplares de um livro que na capa reproduzia uma obra de um pintor francês julgando tratar-se de pornografia) demonstra que não é assim. Como se viu por aquilo que então se disse, toda a gente conhece a obra do pintor, nomeadamente a obra que causou o incidente, excepto os nossos rapazes da PSP, unanimemente considerados umas bestas, e prontamente acusados de não estarem à altura da nossa imensa cultura. Mas o mais impressionante neste género de casos é constatar-se que qualquer analfabruto que queira botar figura e impressionar os pategos tem a arte como coisa importante, e como tal considera lacuna de monta não ter conhecimentos sobre a dita. Daí que jamais dirá que não conhece, que não sabe, que não viu. O lamentável é que o sujeito invista a esconder a ignorância em arte em vez de investir a interessar-se por ela, pois o interesse valer-lhe-ia, seguramente, a pena — além de que evitaria deixar o rabo de fora, como sempre acontece quando se escondem estas coisas. Infelizmente, não é assim que ele pensa. As aparências são, para ele, mais importantes que tudo o resto, e nos tempos que correm ninguém se espanta que a montra não corresponda ao armazém. Como se viu, aliás, pelos concertos para violino que Chopin nunca compôs e pelo livro que Sartre nunca escreveu, que um ex-primeiro-ministro nos garantiu ter ouvido e um candidato a primeiro-ministro jura ter lido — episódios que só não passaram completamente despercebidos (ou por manifestações de alta cultura) porque os adversários políticos de Santana Lopes e de Passos Coelho observam à lupa o que eles dizem, e não perdoam deslizes destes. Não porque atribuam grande importância a estas minudências, escusado será dizer. Até porque geralmente não são, nessa matéria, melhores do que eles. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 1-4-2009]</span><br />
<span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">(*) Bestseller «traduzido» por Alexandre O’Neill</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-57338873371536158492014-02-18T14:01:00.005-05:002014-02-18T14:01:56.647-05:00<b>PORNOGRAFIA I.</b> Além de um atentado à liberdade de expressão de fazer lembrar os piores tempos de antigamente, como foi dito e repetido pelos «guardiões do regime» e me pareceu uma comparação obscena, quatro juristas garantiram, ao Público, que a apreensão de meia dúzia de livros que na capa contêm a reprodução de uma obra de Courbet representou «uma falha monumental» da PSP «no campo da cultura», e um episódio que, segundo eles, «identifica o baixo nível cultural» da dita. Também o deputado António Filipe, do PC, não teve dúvidas de que o episódio de Braga foi ridículo «do ponto de vista cultural», por ser tratar, segundo ele, «de um quadro mundialmente célebre», como tal conhecido do Minho ao Algarve. Ora, eu gostaria de dizer, sobre isto, duas coisas. Distinguiriam os ilustres juristas e o sr. deputado A Origem do Mundo da mais corriqueira pornografia caso não fosse tanto alarido? Com vossas licenças, duvido. Depois, qual é a diferença entre A Origem e o que vulgarmente se designa por pornografia? Como os srs. juristas e o ilustre deputado muito bem sabem, bater na PSP é barato e tem sucesso garantido, mas as razões não me convencem. Dizer que foi um atentado à liberdade de expressão o episódio de Braga é um exagero, mas ainda vá. Já aproveitar a ocasião para tecer considerações de índole artístico-cultural, acusando os agentes da polícia de ignorantes para cima por não conhecerem o artista e as suas obras, é um manifesto exagero — além de ser duvidoso que os cavalheiros tenham, sobre a matéria, autoridade para chamar ignorante a quem quer que seja. Descontando os lugares-comuns e a sobranceria com que os proferiram, por si só indicadores de parcos conhecimentos sobre o assunto, não disseram nada que um agente da PSP mais expedito não fosse capaz de dizer. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 11-3-2009]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-84352739785431542192014-02-18T14:00:00.005-05:002014-02-18T14:00:57.095-05:00<b>HOLOCAUSTO.</b> Negar o Holocausto, só por ignorância ou má-fé. Se o primeiro motivo não é aceitável, o segundo é abominável. Dito isto, discordo frontalmente da ideia de que negar (questionar, minimizar, manipular, etc.) o Holocausto é «intolerável», como ainda há pouco disse Bento XVI, embora se desconheça até onde poderá ir o que o Papa considera «intolerável». Goste-se ou não da ideia, parece-me óbvio que um cidadão do «mundo livre» tem o direito de negar o Holocausto, como tem o direito de negar que o Homem foi à Lua, que Hitler tenha existido, ou que Estaline não foi o facínora que se sabe. Por ignorância, por má-fé, pelo que for. É que, por mais voltas que se dê, uma proibição deste teor tem um nome: atentado à liberdade de expressão, para mim mais grave que dizer-se o que se diz do Holocausto. E a liberdade de expressão inclui, naturalmente, dizer asneiras, incluindo asneiras que podem ofender, como no caso do Holocausto. Isto por uma questão de princípio. Na prática, devo dizer que ainda acho pior. Como julgo evidente, a proibição seria (é, nos casos onde existe) uma medida contraproducente. Por todas as razões conhecidas, e porque os judeus já inspiram ódio que chegue. Se fizerem questão de calar quem põe em causa o Holocausto, calem-nos com argumentos — ou, então, com os tribunais. Se nada disso for bem-sucedido, deixem-nos falar. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 19-2-2009]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-69736555203065524632014-02-18T14:00:00.000-05:002014-02-18T14:00:01.858-05:00<b>DA LIBERDADE.</b> Como seria de esperar, as declarações do cardeal-patriarca de Lisboa a propósito do casamento entre cristãos e muçulmanos deram azo a reacções da malta do costume, pelas razões do costume. Segundo eles, D. José Policarpo foi longe de mais, pois não devia generalizar situações que estarão longe de se poderem generalizar. Curiosamente, a questão da mulher no Islão, mais precisamente a falta de liberdade da mulher no Islão e a violência a que é sujeita, nunca lhes mereceu o mais leve reparo. Avisar as católicas para o «monte de sarilhos» a que poderão estar sujeitas caso decidam casar com muçulmanos, como fez o cardeal Policarpo, é, para eles, inaceitável. Mas já é aceitável a violência sobre as mulheres muçulmanas, sobre a qual nunca se pronunciam a pretexto de que a cultura delas é assim, e há que respeitar a cultura delas. Caí na asneira de criticar Bento XVI por causa de um discurso que ele proferiu numa universidade alemã (considerei então que o Papa fez uma provocação desnecessária aos muçulmanos), mas não volto a cair noutra. Digo asneira porque o Papa não deve inibir-se de dizer o que pensa por receio de consequências, pois do Papa espera-se que diga o que pensa — e a regra aplica-se, naturalmente, ao cardeal Policarpo. Sobretudo quando estão em causa os valores da cultura ocidental (a nossa), que não caíram propriamente do céu, e que ficam em causa sempre que nos calamos perante situações que requerem denúncia, que nos rendemos ao politicamente correcto, que pedimos desculpa por existir. Como, aliás, muito bem demonstrou o episódio dos cartoons publicados por um jornal dinamarquês, que deu no que deu e causou mais estragos à liberdade de expressão do que possa parecer. Ceder em valores que temos por essenciais, é abrir caminho para nos exigirem ainda mais. Como diz o ditado, quanto mais a gente se abaixa, mais se vê o rabo. Escusado será dizer o que virá a seguir se entrarmos por esse caminho. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 28-1-2009]</span>Unknownnoreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-8992338892009015409.post-40107548257541106062014-02-18T13:59:00.000-05:002014-02-18T13:59:05.004-05:00<b>PACIFISTAS.</b> Lembram-se do autarca que ameaçava puxar de pistola caso alguém lhe falasse de cultura? Pois apetece-me fazer o mesmo quando ouço falar de pacifistas. É que eu espero dos pacifistas o que me parece normal esperar deles: que defendam incondicionalmente o fim da guerra, seja a guerra qual for, e isso raramente acontece. Em vez de defenderem a paz, os pacifistas limitam-se a condenar uma das partes em conflito, a quem exigem que pare de agredir a outra. Pior: as vítimas inocentes de uma guerra nunca são, para eles, iguais. Se forem palestinianos ou iraquianos, saem à rua a protestar. Se forem israelitas ou americanos, calam-se muito caladinhos. Onde estavam os pacifistas quando os palestinianos se matavam uns aos outros? Que me lembre, não tugiram, nem mugiram. Pior outra vez: se pudessem, não hesitariam em pegar em armas e combater uma das partes, no caso presente Israel, mas o exemplo podia ser outro. O presidente iraniano prossegue o programa nuclear apesar das sanções da ONU e da condenação generalizada e ainda lhe sobra tempo para ameaçar varrer Israel do mapa — e os pacifistas não se ouvem. Mas já se ouvirão caso ganhe consistência a hipótese de um ataque israelita ao Irão, mesmo sabendo os pacifistas que Israel tem uma ameaça real sobre a sua cabeça, e que seria um suicídio nada fazer de forma a travar Ahmadinejad. Claro que há quem seja genuinamente pacifista, mas esses não são para aqui chamados — e, infelizmente, não contam. Falo dos pacifistas para quem a paz não é um fim mas um meio de alcançar outros objectivos, evidentemente que nem todos recomendáveis, e infinitamente menos importantes que a paz. Falo dos pacifistas que só se distinguem dos fundamentalistas que se fazem explodir por aquilo em que acreditam porque os pacifistas se limitam a legitimar estes comportamentos e as suas causas. Infelizmente, os pacifistas servem, apenas, para incendiar, ainda mais, os conflitos pelos quais juram ralar-se, quando deles se esperaria que contribuíssem para lhes pôr fim. Pena é que nem todos percebam as razões que os movem, e que ainda lhes atribuam um estatuto que não merecem. <span class="Apple-style-span" style="font-size: x-small;">[Originalmente publicado em 7-1-2009]</span>Unknownnoreply@blogger.com